terça-feira, 9 de junho de 2020

OMS recua e reconhece transmissão assintomática da Covid-19, mas diz que falta 'saber quanto'

Após reações de especialistas em diferentes países e de governos como o do Brasil, a Organização Mundial da Saúde (OMS) esclareceu nesta terça-feira que há registros de transmissão de Covid-19 por pacientes assintomáticos, mas que ainda não se sabe a dimensão do processo. Ontem, uma representante da entidade declarou que a transmissão do coronavírus por pessoas que não manifestam sintomas "é muito rara" com base em estudos de Cingapura, país que tem adotado rigoroso rastreamento de contatos.
"Estamos absolutamente convencidos de que a transmissão por casos assintomáticos está ocorrendo. A questão é saber quanto", afirmou o diretor de emergências da OMS, Michael Ryan.
Ontem, a chefe da unidade de doenças emergentes da entidade, Maria Van Kerkhove, comentou o estudo do país asiático quando indagada por uma jornalista em uma coletiva de imprensa.
"Nós temos relatórios de países que estão realizando o rastreamento de contatos (mapeamento de indivíduos que estiveram com pacientes diagnosticados no período de incubação do vírus) de maneira bastante criteriosa. Eles estão acompanhando casos assintomáticos e não identificaram a transmissão para outros indivíduos. É muito raro e muitos desses detalhes ainda não foram publicados na literatura (médica)", afirmou Maria. "Estamos analisando constantemente esses números e seguimos na tentativa de obter mais informações destes países para responder definitivamente a essa dúvida".
Hoje, a representante da OMS voltou a se pronunciar e reconheceu que alguns modelos estimam uma taxa de transmissão de 40% no caso de pacientes assintomáticos.
Especialistas rebatem
Nesta manhã, em uma reunião ministerial, o presidente Jair Bolsonaro criticou a OMS e disse que, a partir das declarações da diretora da unidade de doenças emergentes, avaliaria a reabertura de escolas e do comércio. O chanceler Ernesto Araújo também criticou o que chamou de "vai e vem" da OMS.
As declarações de Maria Van Kerkhove, no entanto, foram rebatidas por epidemiologistas de vários países. Especialistas lembraram que há estudos consolidados sobre o papel dos assintomáticos e lembraram que parte expressiva do contágio pelo coronavírus é promovido por pacientes na fase pré-sintomática. Estima-se que o vírus comece a ser transmitido dois a três dias antes da manifestação dos primeiros sintomas.
"Eu fiquei muito surpreso com a declaração da OMS. Isso vai contra a minha percepção dos dados científicos que sugeriram, até agora, que pessoas assintomáticas e pré-sintomáticas (que contraíram o vírus e ainda não manifestarma sintomas) são importantes fontes de contágio para outras pessoas", disse Liam Smeeth, professor de epidemiologia clínica na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, pontuando que desconhece dados que embasariam a fala de Maria.
"(Considerar os pacientes assintomáticos) Tem importantes implicações para medidas de identificaçao, rastreamento e isolamento que estão sendo implementadas por vários países", afirmou Babak Javid, consultor de doenças infeciosas do hospital da Universidade de Cambridge (Reino Unido).
A força-tarefa contra a Covid-19 de Cingapura informou à Reuters que identificou casos de transmissão assintomática no país, em especial entre pessoas de vizinhanças próximas. Na última semana, a China informou que os 300 casos assintomáticos identificados em Wuhan, cidade onde o coronavírus foi identificado pela primeira vez e cuja população de 11 milhões foi testada, não se mostraram infecciosos.

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