Além de Deus, existem profissionais sempre lembrados e solicitados em momentos de grandes riscos, crises e ameaças – os de Saúde, os do Direito e os Soldados.
Ao cidadão de bom senso, traz insegurança ver os três Poderes da República, no âmbito de grave crise sanitária, empenhados em mútuo e disruptivo conflito político, onde as três atividades profissionais poderão subir ao palco do embate simultaneamente.
Hoje, falta apenas a última delas, a militar, e isso não será bom.
Porém, numa escalada em que os três Poderes provoquem desequilíbrio entre si e ruptura institucional, que desaguem em convulsão social e anomia, essa indesejável presença irá acontecer para salvar o próprio Estado de Direito, a democracia e a paz interna.
O artigo nº 142 da Constituição Federal atribui às Forças Armadas: a defesa da Pátria, portanto sua soberania e unidade política; a garantia dos Poderes Constitucionais, portanto a harmonia e o equilíbrio entre esses pilares da democracia; e a recuperação da lei e da ordem em caso de anomia e consequente convulsão social.
Que fique bem claro não se estar defendendo a implantação de regime militar, nem lei de exceção, mas sim a ordem institucional vigente.
O que preconiza o artigo está sendo afetado pelas ações dos próprios Poderes da União, considerada a vertente política desse injustificável conflito, onde são evidentes o mau gerenciamento pelo Executivo e os nefastos interesses de lideranças dos demais Poderes, ou seja, os da velha política patrimonialista e fisiológica.
Em tal cenário, decisões de ministros da Suprema Corte devem ser respaldadas no que seja legal e justo, mas precisam refletir bom senso, jamais se deixando poluir no afã de satisfazer egolatrias nocivas.
Urge atuar para a recuperação da coesão nacional, harmonizando as instituições para suplantar a crise sanitária e o conflito político, ambos cindindo a sociedade.
Causou espécie a decisão do Ministro Celso de Mello que, soberbamente, invocou mandamento da época imperial: condução “debaixo de vara” de ministros do Executivo, ressaltando, ainda, que a Suprema Corte dá “valioso precedente”.
Dizeres inúteis, pois os ministros iriam acatar a decisão, não por temerem a espetaculosa ameaça, mas por serem cidadãos-soldados cientes de suas obrigações legais.
A história não se repete, mas, em situações semelhantes, embora longínquas no tempo, se os gestores de hoje cometerem erros similares aos do passado, as consequências poderão ser, infelizmente, igualmente danosas.
A propósito, trago a lume um episódio que teria ocorrido, também, no âmbito de um conflito entre Poderes no início da República.
Refiro-me a uma passagem atribuída a Floriano Peixoto, então Presidente, quando se referiu ao Supremo Tribunal de Justiça, pretório excelso de então, dizendo:
“Se os seus ministros concederem ordens de Habeas Corpus contra os meus atos, eu não sei quem amanhã lhes dará o Habeas Corpus de que, por sua vez, necessitarão”.
Quem tem certeza da própria autoridade moral não precisa decidir com ameaças provocativas e inúteis.
Serenidade e bom senso é o que se espera das autoridades da República, ao invés de egolatria nociva e disruptiva em momento tão delicado.
Luiz Eduardo da Rocha Paiva - General reformado do Exército Brasileiro
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