É possível que as manifestações de rua deste Sete de Setembro, que têm sido a obsessão do mundo político brasileiro nas últimas semanas, acabem sendo uma coisa rala, muito abaixo do que esperam os admiradores do presidente Jair Bolsonaro – e abaixo, ao mesmo tempo, do que causa tanto pavor junto aos seus inimigos. Podem, ao contrário, reunir gente que não acaba mais e receberem a classificação de movimento de massa de primeira grandeza. Tanto num como no outro caso, não muda o verdadeiro problema que envenena a política brasileira no momento: o que fazer com o presidente da República, hoje e principalmente no futuro? É um nó de marinheiro – e daqueles difíceis de desmanchar.
As manifestações pró-Bolsonaro têm sido vistas pelo Supremo Tribunal Federal, pelas elites pensantes, pela mídia, pela oposição em peso, pelas classes intelectuais e até mesmo pelos banqueiros – imaginem aonde chegamos – como uma ameaça direta à democracia. O presidente, por este modo de ver as coisas, está querendo usar a rua (se conseguir mesmo encher a rua de gente) para desmoralizar as “instituições”, romper com as leis e dar um golpe de Estado. Mesmo que não seja quebrada nem uma vidraça, como vem sendo a regra nesse tipo de protesto público, os manifestantes vão com certeza falar o diabo – e isso, hoje em dia, é considerado infração gravíssima. (Grave a ponto de o STF, como medida de resistência aos golpistas, ter decretado ponto facultativo no dia 6 – uma bela “ponte” que vai render quatro dias seguidos de feriadão, do sábado à quarta-feira, dia 8).
Vastas emoções, portanto – mas com pensamentos imperfeitos. Aconteça o que acontecer na rua no dia 7 de setembro, não vai haver golpe militar nenhum. O motivo disso é muito simples. Golpe militar tem de ser dado por militar, e o militar brasileiro não quer dar golpe – não quer, não pode, não tem planos para isso, não tem liderança, não tem recursos, não obedece a carro de som nem à barulheira em rede social. Golpe exige força – e o único que tem força, o Exército Brasileiro, não vai se meter nisso. Em compensação, os inimigos do presidente continuam com o mesmíssimo problema que têm agora: o risco de que ele permaneça no governo até o fim do mandato, coisa que acham intolerável – ou, muito pior ainda, que fique por quatro anos além disso, se for reeleito. Aí já seria o fim do mundo.
Teoricamente não deveria haver problema nenhum com nada disso. Se Bolsonaro é mesmo o pior presidente que o Brasil já teve em toda a sua história, e se ainda por cima é genocida, ladrão de vacina e culpado por todas as desgraças que o País tem hoje, ele vai ser derrotado por qualquer outro candidato nas eleições de 2022, não é mesmo? Que risco pode haver se o presidente é realmente o monstro que aparece todos os dias no noticiário? Os institutos que pesquisam “intenção de voto”, aliás, dizem que o grande nome da oposição, o ex-presidente Lula, já está com mais de 50% dos votos no papo; mais um pouco, na toada em que está indo, chega aos 100%. Como um desgraçado da vida como Bolsonaro poderia ganhar dele, ou de outro qualquer?
Acontece que não é assim, claro – ou ninguém acredita mesmo que esteja sendo assim. Na vida real da política o Datafolha é uma coisa e a eleição é outra; eleição, na prática, é voto na urna, e não no jornal ou nas notícias do horário nobre. O panorama visto de hoje, pelo estado de excitação nervosa extrema que foi montado em torno do presidente da República, dá a entender que existe a possibilidade real de Bolsonaro ganhar a eleição. E aí? Há cada vez mais gente, no Brasil que manda, dizendo que “não dá para esperar”. Como fica, então?
J. R. Guzzo - Jornalista
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