Nas
mais recentes discussões sobre as queimadas na Amazônia, envolvendo não só a
opinião pública brasileira, como também a mídia e os políticos e governantes de
todo o mundo, o primeiro grande impasse se deu na discussão sobre a até que
ponto os outros países do mundo poderiam interferir na questão dos incêndios
amazônicos que ocorrem em diversos países da América do Sul, além do Brasil,
que possui sob sua jurisdição a maior “porção” da floresta.
Por
um lado, as normas do direito público internacional que regulam as relações
entre os países deixam uma enorme “brecha” nas QUESTÕES AMBIENTAIS MUNDIAIS que
possam envolver riscos e danos à segurança, e mesmo à “saúde”, provindos do
meio ambiente de um determinado país, ou conjunto de países, desde o momento em
que os seus efeitos danosos, temporários ou permanentes, possam atingir outros
países, limítrofes ou não.
A
pergunta que se impõe num primeiro momento é se as populações dos países que se
restringem a receber os efeitos nocivos, provenientes dos danos ambientais
ocorridos nos outros países, têm ou não o direito de reclamar e exigir medidas
dos outros países para que impeçam esse uso danoso.
Ou,
em palavras diferentes, se as “soberanias” dos outros países podem prevalecer sobre
o bem-estar e a soberania da população de cada país, que por vezes, só para dar
um exemplo, se vê forçada a respirar a fumaça e o ar poluído por incêndios
florestais em outros países.
Essa
reclamação seria desrespeito às diversas soberanias nacionais? O uso, bom ou
mau, de cada território nacional deve ser ilimitado e não sujeito a reclamações
e protestos dos outros? Essa “soberania” seria ilimitada?
É
por essa simples razão que o Presidente francês, Emmanuel Macron, não disse
nada de errado quando afirmou que “a nossa casa está pegando fogo”. Com isso
ele não quis dizer que a Amazônia “em chamas” seria da França. Mas sem dúvida
ele fez uso político de “esquerda” dessa impactante declaração.
Mas
o incêndio amazônico de agosto de 2019 não é nenhuma novidade. Ele está dentro
da média dos outros incêndios na mesma região, nos últimos 15 anos. E eles
também acontecem, com a mesma ou maior intensidade, em diversas outras partes
do mundo. Mas esses outros incêndios não vão para a mídia, como acontece com o
incêndio da Amazônia de hoje.
Apesar
de tudo, Macron não falou nada demais se interpretarmos que o incêndio na “sua
casa” estava significando o incêndio no “seu planeta”, visto que a Terra também
pode significar a casa de cada um, de todos, portanto. O condenável foi o uso
meramente político e demagógico que Macron fez da situação.
Como
grandes causadores de danos ambientais globais podem ser citados os frequentes incêndios
nas florestas dos diversos países e a poluição do espaço aéreo e das águas correntes,
que acabam “envenenando” toda a atmosfera, e desaguando nos mares, oceanos e
todas as águas internacionais.
A
ciência do direito tem que ter coerência e lógica entre as suas diversas áreas.
Portanto, o melhor guia para explicar o direito de todos os povos e nações de
interferirem nas chamadas “soberanias”
dos outros países, como fez Macron em relação ao incêndio da Amazônia, pode ser encontrado no DIREITO
PRIVADO (Direito Civil), que apesar de garantir a propriedade privada, impõe
LIMITES na sua utilização, não admitindo, por exemplo, que o seu eventual mal
uso prejudique o direito da “vizinhança”, dos outros, dando remédios jurídicos
para os que se sentirem prejudicados pelos abusos do “vizinho” corrigirem a
situação.
Por
conseguinte, o direito de vizinhança na propriedade privada e o direito de
“vizinhança” no direito internacional entre os povos dos diversos países devem
ser tratados com idênticos critérios e fundamentos morais, políticos e
jurídicos. A soberania individual de cada país sempre terá que ter limites,
respeitados os direitos dos outros países. Por isso os incêndios florestais não
podem ser considerados problemas só dos respectivos países onde ocorrem, como
equivocadamente pretendem as autoridades brasileiras.
Sérgio Alves de Oliveira - Advogado e Sociólogo
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