Nas capitais, a truculência das ditas Guardas Municipais contra cidadãos desarmados lembram as milícias fascistas de Mussolini e, envergonham os policiais que a duras penas conquistaram o respeito e a admiração da população
A maioria dos policiais do Estado de São Paulo, sobretudo os cerca de 100.000 soldados, sargentos e oficiais da Polícia Militar, sabem o quanto foi difícil conquistar, ano após ano, dia após dia, o respeito, a admiração e o prestígio que desfrutam hoje junto à população paulista. Depois de décadas sofrendo uma imagem negativa, pela hostilidade que lhes é dada nos meios de comunicação e pelas lembranças de um regime militar que começou quando praticamente nenhum policial paulista havia sequer nascido, um PM de São Paulo é hoje, em geral, uma figura bem quista pelo cidadão da capital e do interior – mais, talvez, que qualquer outra autoridade pública. É comum serem cumprimentados na rua pelas pessoas. São aplaudidos com frequência quanto passam em seus carros ou motos. São solicitados a posar para selfies.
É com aflição, assim, e cada vez mais com indignação irada, que muitos policiais de São Paulo estão vendo a sua imagem ser destruída, dia após dia, pelas violências, ilegalidades e atos de estupidez que seus superiores mandam cometer em nome do combate ao coronavírus. Pior: estão pagando por delitos dos quais nem participam, já que são cometidos em geral por agentes das Guardas Municipais, com as quais não têm nada a ver. Só que o prejuízo para a imagem é “da polícia” como um todo. A maioria da população não se importa em diferenciar PM de GCM – na visão das pessoas, se está fardado, é tudo “polícia”. Toda a corporação, assim, acaba pagando pela brutalidade de guardas fardados que sequer tem o “poder de polícia” legal; são pouco mais que seguranças privados, contratados pelas prefeituras para proteger o patrimônio municipal e servir como fonte de empregos para o benefício de políticos.
Não aparece na mídia tradicional, mas as redes sociais registram a cada dia que passa mais agressões físicas contra cidadãos que não cometeram crime algum por parte de gente que veste farda. Acaba de acontecer, com direito a vídeo e áudio, em Araraquara, onde uma mulher foi presa , agredida, jogada no chão e algemada pela CGM local. Seu crime? Estava sentada, sozinha, no banco de uma praça pública, e recusou-se a voltar para casa quando os guardas mandaram. Dá para ver, até, que os agentes (que incluíam uma guarda feminina), agiram com a educação, paciência e moderação possíveis quando se faz uma prisão. Mas isso não muda em nada o desastre para a imagem da polícia causada por uma cena dessas. Logo em seguida, em São Paulo, outra mulher foi agredida pela GCM por estar fora de casa. A coisa toda, claramente, está saindo do controle.
O governador João Doria, em cima disso, jogou gasolina na fogueira ao anunciar que vai mandar prender quem não cumprir aquilo que ele considera como “violação do confinamento”. Aí é a PM, mesmo, quem será diretamente envolvida na espiral de violência. Entidades que representam oficiais da PM de São Paulo já expuseram sua revolta contra isso – preocupam-se, justamente, em receber ordens para desrespeitar a Constituição e o Código Penal dadas pelo próprio governo estadual, amparado em decretos de autoridade duvidosa e outras justificativas legais marca barbante. Não querem, é lógico, ser processados depois por ilegalidades cometidas por quem está acima deles.
A posição social, moral e de respeito que os policiais de São Paulo conseguiram – e que faz a polícia paulista ser considerada a melhor do Brasil – não é apenas um motivo de orgulho para a PM, um órgão de segurança cujas origens estão em 1831, e os agentes civis. É, também fruto de trabalho muito duro, de treinamento intenso, de disciplina, de aplicação, de aprendizado da lei e da coragem de expor as suas próprias vidas, todos os dias, na proteção aos direitos e à segurança do cidadão. É natural que, após tantos anos de esforços, a polícia de São Paulo não queira ver a sua conquista ser jogada no lixo.
J. R. Guzzo - Jornalista
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