O fato mais importante da década para o Brasil foi a explosão na cena nacional de um moço nascido no norte do Paraná, formado numa faculdade de direito da cidade de Maringá e desvinculado de corpo e alma do grande circuito São Paulo-Brasília-Rio de Janeiro de celebridades jurídicas, reais ou imaginárias. Seu nome, como todo o Brasil e boa parte do mundo sabe hoje, é Sérgio Moro – um típico “juizinho do interior”, como foi definido na ocasião pelo ex-presidente Lula e sua corte imperial. Todo mundo se lembra: eles simplesmente não entenderam nada quando Moro começou a chamá-lo, como um cidadão normal, para prestar contas à Justiça sobre o que tinha feito em seus tempos de poder e glória. Onde já se viu uma coisa dessas? O titular de uma modesta Vara Criminal de Curitiba, com pouco mais de 40 anos de idade, querendo interrogar, processar e talvez até condenar “o maior líder político” da história do Brasil? Pois é. Era isso mesmo. E o mundo inteiro sabe o que aconteceu depois.
Sérgio Moro mudou a realidade do Brasil como ninguém mais, nestes últimos dez anos – ou 50, ou sabe-se lá quantos. Condenou e botou na cadeia por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, pela primeira vez na história, um ex-presidente da República. Comandou a maior operação judicial contra a corrupção jamais realizada no Brasil. Não só a maior: a primeira feita para valer em 500 anos, a mais bem-sucedida em termos de resultados concretos e a mais transformadora da vida pública que o País já conheceu. Moro, no comando da Lava Jato, conseguiu mostrar a todos, na prática, que a impunidade das castas mais ricas, poderosas e atrasadas da sociedade brasileira não tinha de ser eterna – podia ser quebrada, e foi. O governo paralelo que as empreiteiras de obras sempre exerceram no Brasil, mais importante que qualquer governo constituído, foi simplesmente riscado do mapa. Em suma: a Lava Jato virou uma nação inteira de ponta-cabeça. Havia um Brasil antes de Moro. Há um outro depois dele.
Exagero? Pergunte à Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa ou OAS se mudou ou não alguma coisa importante em suas vidas. A mesma pergunta pode ser feita às dezenas de políticos processados e presos, a empresários piratas que durante décadas saquearam o Tesouro Nacional e aos monarcas absolutos que reinavam nas diretorias das empresas estatais: e aí, pessoal, tudo bem com vocês? Dá para ver se houve ou não mudança, também, quando se constata que a ação de Moro levou milhões de brasileiros para as ruas, num inédito movimento de massas contra a corrupção. Varreu do poder um partido, um sistema e milhares de militantes políticos que mandaram no Brasil durante mais de 13 anos. Fez uma presidente ser deposta do cargo por fraude contábil.
Moro e o seu time fizeram muito mais que condenar 385 magnatas, aplicar 3.000 anos de penas de prisão e recuperar para o erário, até agora, R$ 4,5 bilhões em dinheiro roubado. É bom notar, também, que em toda a Lava Jato não há um único trabalhador punido. Não há nenhum inocente na prisão, agora ou desde que a operação começou, em 2014. Não há, enfim, uma única ilegalidade em nada do que Moro fez – tomou centenas de decisões e três tipos de tribunais superiores a ele examinaram com microscópio tudo o que fez, sem encontrar nada de errado até hoje em sua conduta moral. Acusou-se Moro, até no STF, de colocar em risco “a democracia”. Bobagem. O que acaba com democracia é golpe militar, e não juiz criminal que põe ladrão na cadeia. Nenhum país do mundo, até hoje, virou ditadura por punir a corrupção dentro da lei.
Sérgio Moro deu ao Brasil uma chance de ser um país civilizado. É muito.
J. R. Guzzo - Jornalista
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